É um desafio constante dos fabricantes de veículos elétricos, dar resposta às preocupações dos condutores em relação à climatização do habitáculo do veículo, sem colocar em causa a autonomia do mesmo. Nenhum fabricante, quer que um cliente de um veículo seu, seja confrontado com a escolha entre usar o sistema de climatização e ficar sem autonomia para chegar a casa, ou conseguir chegar a casa, mas a tremer de frio ou a suar por excesso de calor.
UMA SOLUÇÃO ENGENHOSA proposta por vários fabricantes para este problema, é a chamada bomba de calor. A bomba de calor, é uma tecnologia que antes de ser usada nos veículos automóveis já era utilizada em edifícios há muitos anos. A bomba de calor é um circuito de refrigeração composto por vários componentes. Na prática, quando estamos a falar de uma bomba de calor, não estamos a falar num único componente, mas sim num conjunto de componentes.
Nos veículos elétricos, a utilização de uma bomba de calor, permite que o calor do ar exterior e o calor produzido pela máquina elétrica e pelos componentes eletrónicos de potência e comando do sistema de propulsão elétrica, sejam utilizados para aquecer o interior do veículo. Com uma bomba de calor, o aquecedor elétrico de alta tensão vai necessitar de menos energia da bateria, pelo que, o consumo de energia é reduzido. A autonomia de um veículo elétrico com bomba de calor, aumenta em comparação com um veículo elétrico idêntico sem bomba de calor. Um modelo de veículo com bomba de calor, pode ter um aumento de cerca de 30% de autonomia em relação a uma versão do mesmo veículo sem bomba de calor.
A transmissão de calor dá-se automaticamente de um nível de temperatura mais alto para um nível de temperatura mais baixo. É este o fluxo natural da temperatura.
Uma bomba de calor usa energia elétrica, através de um compressor elétrico, para bombear calor contra o fluxo natural da temperatura, ou seja, de um nível de temperatura mais baixo para um nível de temperatura mais alto.
Na prática, as bombas de calor transportam energia térmica de um local para outro. Como foi dito atrás, desde há muito tempo que as bombas de calor são utilizadas para aquecer espaços em edifícios. Entre vantagens gerais desta tecnologia de aquecimento, temos um menor consumo de energia, baixos custos operacionais e baixos níveis de poluição.
Tal como num sistema de ar condicionado, no circuito fechado da bomba de calor existe um fluído refrigerante, que circula e muda de estado, entre o estado líquido e o estado gasoso, com variações da pressão e temperatura. O fluído refrigerante tem a tarefa de garantir a transferência e o transporte do calor. No circuito da bomba de calor, está sempre presente uma pressão mais alta que a pressão atmosférica normal. O que os quatro componentes principais do sistema fazem, é basicamente o seguinte: O compressor é o elemento que produz trabalho, através de energia elétrica. Ele aspira fluído refrigerante frio e gasoso a baixa pressão e comprime-o a alta pressão, aumentando a temperatura do refrigerante. Após o compressor, o fluído refrigerante está no estado gasoso, sob alta pressão e a uma alta temperatura.
O ar frio do exterior (fluxo de ar / ventilador) flui através do condensador. No condensador, o fluído refrigerante vindo do compressor, transfere calor para o ar e condensa. O ar aquecido que flui é utilizado como ar de aquecimento para o interior do habitáculo do veículo. Nesta fase, o fluído refrigerante está no estado líquido e sob alta pressão a uma média temperatura. A seguir, a pressão do fluído refrigerante líquido é reduzida significativamente na válvula de expansão, o que leva à expansão e evaporação parcial do fluído refrigerante. Após a expansão, a temperatura do fluído refrigerante é significativamente menor que a temperatura ambiente.
Depois da válvula de expansão, no evaporador, a pressão do fluído refrigerante pulverizado é reduzida ainda mais e evapora. O calor de vaporização necessário neste processo é extraído do ar exterior mais quente, que arrefece ao longo do processo. O fluído refrigerante agora gasoso, sai do evaporador em direção ao compressor. O fluído refrigerante utilizado no circuito da bomba de calor, pode ser o R134a ou o R-1234yf. Ambos os fluídos refrigerantes são gases fluorados que possuem um ponto de ebulição baixo. O ponto de ebulição é a temperatura à qual uma substância muda do estado líquido para o estado gasoso e é sempre dado à pressão atmosférica normal (1,01325 bar). No caso do refrigerante R134a, o ponto de ebulição é de -26,07 ºC e no caso do refrigerante R-1234yf, o ponto de ebulição é de -29,45 ºC. Valores muito baixos quando comparados com a água, que tem um ponto de ebulição de 100 ºC.
Mas também sabemos, que a temperatura de ebulição varia de acordo com a pressão, aumentando com o aumento da pressão e diminuindo com a diminuição da pressão.
Assim, numa bomba de calor, alterando especificamente a pressão e a temperatura, o fluído refrigerante é capaz de evaporar e absorver calor à temperatura ambiente ou, condensar e libertar calor à temperatura ambiente. Na realidade, uma bomba de calor de um veículo elétrico, pode ser um sistema com diferentes níveis de complexidade, e em que podem intervir mais ou menos circuitos e componentes. Uma bomba de calor pode funcionar na função de aquecimento, mas também na função de arrefecimento. Ou seja, a bomba de calor pode servir para aquecer ou para arrefecer o interior habitáculo do veículo.
Dependendo do modo de funcionamento que se pretende da bomba de calor, função de aquecimento ou função de arrefecimento, a bomba de calor pode utilizar apenas o circuito de fluído refrigerante, ou então, utilizar também em conjunto, o circuito de líquido de arrefecimento dos diferentes componentes do sistema de propulsão elétrica do veículo. Assim, além dos principais componentes que foram falados atrás, uma bomba de calor pode ter mais componentes destes dois circuitos a intervir, em função da situação. No circuito de fluído refrigerante, estamos a falar, por exemplo, de válvulas de corte e de expansão, reservatório acumulador, condensador de calor, permutador de calor do condensador de calor e sensores de pressão e temperatura. No circuito de líquido de arrefecimento dos diferentes componentes de propulsão elétrica, além dos próprios componentes, podemos falar, por exemplo, do aquecedor elétrico, bombas de circulação, válvulas de não retorno, válvulas de bypass e sensores de temperatura. Na figura, podemos observar em esquema, um exemplo do circuito de fluído refrigerante e do circuito de líquido de arrefecimento, de uma bomba de calor de um veículo automóvel que já possui alguma complexidade. Neste artigo, vamos analisar o funcionamento deste tipo de bomba, que podemos ver em modelos do fabricante alemão Volkswagen.
COMPRESSOR ELÈTRICO
O compressor elétrico é semelhante a um compressor elétrico do sistema de ar condicionado de um veículo sem sistema de bomba de calor. Como foi dito atrás, o compressor elétrico aspira o fluído refrigerante gasoso a baixa pressão e comprime-o, aumentando a pressão e a temperatura do fluído refrigerante. O compressor empurra o fluído refrigerante para o condensador, sob a forma de um gás quente. Na prática, o compressor define um ponto de separação entre a zona de baixa pressão e a zona de alta pressão do circuito de fluído refrigerante.
CONDENSADOR DE CALOR
O condensador de calor é um condensador interior, que consiste normalmente, num sistema de tubos serpentinos fixados por alhetas. Este componente oferece uma grande área de troca de calor para uma boa transferência de calor. O condensador de calor é atravessado por um fluxo de ar do ventilador da unidade de aquecimento e de ar condicionado.
A condensação é uma transformação, que consiste na passagem do estado gasoso para o estado líquido. Após o compressor, o fluído refrigerante quente e gasoso chega ao condensador de calor. Os tubos e alhetas do condensador de calor absorvem o calor do fluído refrigerante. O ar exterior fresco flui através do condensador de calor, absorve o calor e é conduzido para o interior do habitáculo do veículo. Ao mesmo tempo, o fluído refrigerante no condensador de calor arrefece, condensa e passa ao estado líquido.
EVAPORADOR
O evaporador tem um design semelhante ao condensador de calor e possui um fluxo interno de fluído refrigerante. Como no condensador de calor, o evaporador é atravessado por um fluxo de ar proveniente da unidade de aquecimento e de ar condicionado. Durante o funcionamento da bomba de calor, na função de aquecimento, o evaporador funciona como um condensador. Isto significa, que o ar que flui através do evaporador é aquecido.
Durante o funcionamento da bomba de calor, na função de arrefecimento, o evaporador funciona como um evaporador. Isto significa, que o ar que flui através dele é arrefecido.
VÁLVULAS DE EXPANSÃO
A válvula de expansão é um componente já é presente nos sistemas de ar condicionado. Na válvula de expansão o fluído refrigerante pode expandir-se, ou seja, passa a ocupar um espaço maior (há um aumento de volume). A pressão baixa significativamente, o fluído refrigerante líquido evapora parcialmente, o que faz com que a temperatura do fluído refrigerante diminua. Durante o funcionamento da bomba de calor, na função de aquecimento, a válvula de expansão é atravessada por um fluxo de fluído refrigerante vindo do evaporador para o condensador. Durante o funcionamento da bomba de calor, na função de arrefecimento, o fluído refrigerante flui através da válvula de expansão na direção oposta.
VÁLVULAS DE CORTE
As válvulas de corte, que se encontram no circuito de fluido refrigerante, regulam a direção e passagem do fluxo de fluído refrigerante no circuito.
As válvulas de corte são válvulas que, ou estão totalmente abertas ou estão totalmente fechadas.
A gestão das válvulas de expansão e das válvulas de corte, é feita por uma unidade de gestão térmica através de redes de comunicação multiplexadas, como é caso da rede LIN (Local Interconnect Network).
CONDENSADOR
O condensador é um condensador convencional de um sistema de ar condicionado. O condensador opera como um evaporador ou um condensador de acordo com o modo de funcionamento da bomba de calor: função de aquecimento ou função de arrefecimento. Na função de aquecimento, o condensador funciona como um evaporador. A evaporação é uma transformação que consiste na passagem do estado líquido para o estado gasoso.
No evaporador, o fluído refrigerante, que não está mais sob pressão e está à temperatura ambiente, é completamente evaporado. O calor necessário é extraído do ar exterior que passa entre as alhetas do evaporador. A pressão do fluído refrigerante permanece constante e a temperatura aumenta um pouco. Permutador de calor do condensador de calor O permutador de calor do condensador de calor, pode ser um permutador de calor de placas convencional, como os usados para arrefecer os circuitos de óleo com líquido de arrefecimento. O circuito de líquido de arrefecimento é separado do circuito de fluído refrigerante. No permutador de calor do condensador de calor, o calor é trocado sem contacto direto nem mistura entre os fluidos, sendo que, o calor do líquido de arrefecimento é transferido para o fluído refrigerante e este evapora. O calor dos componentes do sistema de propulsão elétrica, como por exemplo, a máquina elétrica de corrente trifásica, os componentes eletrónicos de potência e comando da propulsão elétrica e o carregador de bordo (unidade de carregamento da bateria de alta tensão), é utilizado para este fim, fornecendo calor ao líquido de arrefecimento.
RESERVATÓRIO ACUMULADOR
O reservatório acumulador é um reservatório que está posicionado a montante do compressor elétrico, na direção do fluxo de refrigerante. O reservatório acumulador serve como depósito de expansão e depósito de armazenamento do fluído refrigerante. A taxa de fluxo de fluído refrigerante no circuito, varia de acordo com diversas condições operacionais, como a carga térmica no evaporador e no condensador ou a velocidade do compressor elétrico. O reservatório acumulador é integrado no circuito de fluído refrigerante, para suavizar essas flutuações.
SENSORES DE PRESSÃO E TEMPERATURA DO FLUIDO REFRIGERANTE
Vários sensores de pressão e temperatura do fluído refrigerante estão instalados no circuito da bomba de calor. Estes sensores medem a pressão e a temperatura do refrigerante, convertem as leituras num sinal elétrico que enviam para a unidade de comando da bomba de calor. Podem medir pressões do fluído refrigerante, com valores de cerca de 0 a 36 bar, bem como, temperaturas do fluído refrigerante com valores de cerca de -40°C a +150°C. Se um ou mais sensores falharem, a pressão e a temperatura do fluído refrigerante são determinadas pelo sistema através de um mapa cartográfico. A fase de aquecimento do interior do habitáculo do veículo é aumentada e a avaria é registada na memória de avarias. Os sensores de pressão e temperatura do fluído refrigerante só devem ser substituídos após a extração do fluído refrigerante.
VÁLVULA DE MUDANÇA DE CIRCUITO DE LÍQUIDO DE ARREFECIMENTO
Pode ser uma válvula de 3/2 vias. O circuito de líquido de arrefecimento é dividido em dois circuitos: circuito grande de líquido de arrefecimento e circuito pequeno de líquido de arrefecimento. Esta válvula é usada para alternar entre o circuito grande e o circuito pequeno com aquecedor de alta tensão (PTC – Positive Temperature Coefficient). Quando não está sob tensão, a válvula está constantemente aberta e apenas o circuito grande de líquido de arrefecimento é ativado. A fase de aquecimento do interior do habitáculo do veículo é então mais longa.
FUNÇÃO DE AQUECIMENTO EM MODO AR
Esta função usa apenas o calor do ar exterior para aquecer o interior do habitáculo do veículo. O compressor elétrico comprime o fluído refrigerante, que fica no estado gasoso, sob alta pressão e alta temperatura. No condensador de calor, que é um condensador interior, o fluído refrigerante transfere calor para o ar e começa a condensar. O ar agora aquecido, flui como ar de aquecimento, para o interior do habitáculo do veículo. As válvulas de corte VC1 e VC2 estão fechadas. A pressão é reduzida através da válvula de expansão VE1 e a temperatura do fluído refrigerante líquido diminui. O evaporador agora funciona como um condensador, o fluído refrigerante condensa e liberta calor, pelo que, o ar agora pré-aquecido no evaporador (a funcionar como condensador) flui ainda mais para o condensador de calor. A válvula de expansão VE3 está fechada. A pressão do fluído refrigerante é reduzida ainda mais por meio da válvula de expansão VE2. A temperatura do fluído refrigerante agora diminui abaixo da temperatura ambiente.
O fluído refrigerante frio, que está abaixo da temperatura ambiente, evapora no condensador. O calor de vaporização necessário para esse processo é extraído do ar exterior mais quente, que depois arrefece.
O fluído refrigerante gasoso sai do condensador e flui através da válvula de corte aberta VC5 na direção do compressor elétrico.
FUNÇÃO DE ARREFECIMENTO
Nesta função, o circuito da bomba de calor usa temperaturas baixas para arrefecer o interior do habitáculo do veículo.
O compressor elétrico comprime o fluído refrigerante. O fluído refrigerante gasoso está sob alta pressão e alta temperatura.
O ar frio não flui através do condensador de calor, pois a comporta de aquecimento está fechada. O fluído refrigerante não se condensa aqui e, portanto, também não liberta calor. A válvula de expansão VE1 fecha o acesso ao evaporador. O fluído refrigerante flui através da válvula de corte aberta VC2 para o condensador.
O fluxo de ar passa através do condensador. O fluído refrigerante transfere calor para o ar e condensa. A temperatura do fluído refrigerante diminui, mas a pressão permanece constante. A pressão e a temperatura do fluído refrigerante líquido são reduzidas através da válvula de expansão VE2. Após a expansão, a temperatura do fluído refrigerante é mais baixa que a temperatura ambiente. O fluído refrigerante evapora completamente no evaporador. O calor de vaporização necessário para este processo é retirado do ar exterior, que depois arrefece. O ar refrigerado flui para o interior do habitáculo do veículo.
O fluído refrigerante gasoso sai do evaporador e flui através da válvula de corte aberta VC1 na direção do compressor elétrico. O primeiro veículo elétrico de série a adotar uma bomba de calor, foi o Nissan Leaf. Outros fabricantes seguiram o exemplo, adotando bombas de calor com diferentes níveis de complexidade, nos seus modelos de veículos elétricos. São exemplos, o Audi e-tron, o BMW i3, o Jaguar I-Pace, o Kia e-Niro, o Renault Zoe, o Volkswagen e-Golf, e outros. Os fabricantes sabem que equipar um veículo elétrico com bomba de calor, não resolve totalmente a questão da autonomia do veículo, quando utilizado em dias de inverno e climas frios, mas ajuda muito. O sistema de climatização de um veículo elétrico, pode fazer baixar bastante a capacidade da bateria. Se estiver a plena carga, pode baixar a capacidade da bateria até cerca de 35%, o que faz aumentar a ansiedade do condutor. O que pode causar mais ansiedade ao condutor do veículo elétrico é ver no display do painel de instrumentos a autonomia prevista a diminuir drasticamente, quando o sistema de climatização está ligado. Por isso, um veículo elétrico com bomba de calor, significa muito para o seu condutor, que verá o seu veículo consumir menos eletricidade e terá que parar com menos frequência para o recarregar. A bomba de calor é mais um sistema do veículo que os técnicos oficinais têm que dominar. Não considerando, porque não foi focado neste artigo os tipos de equipamentos e procedimentos de serviço para a manutenção e reparação de sistemas com bomba de calor, não deve ser esquecido que, qualquer intervenção num sistema instalado num veículo a motor, que implique gases fluorados como o R134a e o R-1234yf, só pode ser efetuado por um técnico atestado por um Organismo de Atestação oficialmente reconhecido.